segunda-feira, 30 de junho de 2008

"Sunday Punch": THE PENDRAKES!

A história costuma valorizar os grupos de rock que se mantêm monolíticos por toda a sua trajetória. Às vezes nem se importando se já transformaram-se em apenas uma pálida cópia do que um dia foram. Mas é a mesma história que mostra a quantidade de novas bandas que surgiram (e surgem) de ex-membros de grandes grupos. Assim o mundo da música gira e garante o dinamismo em novas interpretações de um mesmo estilo.

Paul Novak vem para provar isso. Fez parte dos ‘power pop heroes’ de Minneapolis The Beatifics. Depois formou com, o colega de banda Andy Schultz, o Betty Drake, que lançou apenas um disco, o sensacional Grape Or Red. Mudou-se para Omaha e engatilhou um novo projeto: The Pendrakes. Novak trouxe um pouco de Beatifics, um pouco de Betty Drake e adicionou country e americana à receita. Deu um toque rural e bucólico ao power pop de guitarras urbanas, ao usar mandolins e acordeons. Convocou para a empreitada os chapas Cory Weber (guitarras), Craig Meier (Baixo), Eric Ebers (bateria) e colocou o debute do Pendrakes Sunday Punch para rodar.

“Dead Man Brake” abre o disco atestando que Novak continua afiado na arte de mesclar guitarras nervosas com melodias adesivas. E que permanece hábil na criação de refrões pop campeões como em “A Real Go Getter”. “Big Changes” fala alto na pegada das guitarras, cadencia na melodia ganchuda e pontua em teclados sutis, lembrando muito o Betty Drake. Soprando em outra direção “Closed Casket” desacelera e vai ritmado na levada do country tradicional.

O pop despretensioso e contagioso de “Anyway Girl” contrasta com o ambiente climático de batida quebrada e piano hipnótico de “Salutations”. Encerra o disco em ritmo de swing music dos anos 30 “All About Love”. Confirmando que a árvore genealógica do power pop cada vez mais se ramifica, dinamizando o gênero com seus novos frutos.

www.myspace.com/pendrakes

quarta-feira, 25 de junho de 2008

"Off The Radar": ALLY KERR!

Quem ainda pára pra ver um pôr-de-sol outonal? E o prazer infantil em pisar tapetes de folhas secas no chão. Alguém ainda sente? Ou encontrar nuvens com formas de animais, alguém consegue? Talvez fosse natural todos estarem abertos às sensações mais ingênuas e puras, mas a verdade da vida é que os anos tratam de endurecer os corações. A pergunta aqui, então é, se melodias ternas e contagiantes, carregadas de boas sensações, servem para amaciar almas insensíveis ou apenas podem ser percebidas pelos ainda sensíveis. De todas as formas, é de se admirar que um artista como o escocês Ally Kerr permaneça um semi desconhecido; e de se louvar que existam músicos com tal sensibilidade melódica – então dizemos amém: o espírito humano pode ter salvação.

Off The Radar, segundo álbum de Kerr, é uma pequena e rara coleção de gemas pop – translúcidas e frágeis como cristal. Podem te trazer a luz de um sol de inverno; ou te levar a um fim de tarde chuvoso... mas, sempre impregnadas de imaculada beleza.
Kerr mostra força autoral em canções emocionais e letras inspiradas. Belle and Sebastian transparece como referência sonora, que também passa por Simon & Garfunkel e algo de Big Star/Chris Bell.

O primeiro single de Off The Radar, “Could Have Been A Contender”, abre o disco apresentando a voz macia e agradável de Kerr e provavelmente a faixa mais B&S do álbum. Segue a placidez melancólica de “Be The One” e o doce contágio de “I Think I’m Bleeding”. A belíssima balada “The Toothbrush Song” não arranca lágrimas e sim um leve sorriso de satisfação. Pegada na empolgante faixa-título e melodia perfeita na macia “Old Friend”; e Off The Radar vai cativando com doses maciças de ganchos pop, violões, pianos, banjos, teclados - tudo direcionado a emocionar.

“Será muito tarde para trabalhar na NASA?.../ Eu quero olhar a Terra lá embaixo/ Eu quero envolver a Lua com meus braços/ Porque tudo que eu queira era ter dito três palavras pra você” diz a letra da canção mais triste e bonita do disco “Is It Too Late To Work For NASA?”. Que contrasta com a perfeição pop da ensolarada "Mystery Star" (“Minha estrela misteriosa era um satélite mentiroso” canta a ironia do refrão).
Provavelmente se você leu estas linhas até o fim, é porque está preparado para Ally Kerr. Mas, se ainda acha que Off The Radar pode não ser pra você, da próxima vez que o sol pintar o céu de laranja e lilás, estacione o carro e pare pra olhar.

www.allykerr.com
www.myspace.com/allykerr

segunda-feira, 23 de junho de 2008

"In Stereo": MARMALADE SOULS!

Parte da nova geração, que hoje circula confiante pelo planeta e exala frescor e juventude, não acredita no hype. Não precisa necessariamente estar interessada em música revolucionária, ou sons digitais. Muito menos em sonoridades pré-fabricadas que passeiam pelas freqüências moduladas do rádio. A força da canção permanece intocável e atemporal. Os ecos do pop sessentista ainda reverberam em dias atuais, mas, cada vez mais, reprocessados e direcionados pela nova geração para a nova geração.

In Stereo, álbum de estréia dos suecos do Marmalade Souls, poderia ter sido gravado-composto-produzido em 1967. Mas veio ao mundo 40 anos depois, perpetuando um estilo de fazer música e mostrando aos contemporâneos que sabemos ser tão bons quanto nossos ídolos foram. O casal Michael Klemmé e Johanna Klemmé, com a ajuda do baterista Paddy Lawless, uniram a paixão pelos Beatles para dar sua visão particular de uma época.

O título da faixa de abertura já entrega a admiração pelos fab four: “It Won’t Be Long Too”. Só que aqui a levada segue pelo pop psicodélico, adoçado nos backing vocals de Johanna. Guitarras invertidas confirmam o clima lisérgico na voz forte de Michael em “Fall Into The Sky”. “Famous” vem no rastro da fase energética do ‘yeah,yeah,yeah’ até o hit pop de melodia contagiante, refrão perfeito e assobiável de “My Heart Belongs To You”. A voz angelical de Johanna embala na ternura de “Daydreams” e reafirma que a canção ainda respira sob a ambição fria e calculista dos tempos modernos.

“Mr. Lemon Tea” capricha no chamado pop e “In My Mind (There Is No Doubt)” pincela belas paisagens folk – bem longe da terra natal do Marmalade Souls. E é aqui que o disco mostra versatilidade de ritmos: a soul music com clima jazzy pop em “Goodbye” e o sotaque bluesy em “Baby Come Back”. Para logo voltar ao eixo principal do pop sessentista na cativante “Belly Butterfly” e na auto-explicativa “Yeah, Yeah!”. A beleza melódica de “Say Goodbye” é realçada na voz aveludada de Johanna e a habilidade como hit maker de Michael, marcada em “Words Of Love”. A canção voz-violão de beira de estrada “Good Days”, pinta a imagem da poeira levantando no retrovisor e encerra In Stereo. Que, por incrível que pareça, não se volta para trás, perpetua um legado fixando, no futuro, o olhar.

www.marmaladesouls.com
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quarta-feira, 18 de junho de 2008

"Cathedral Square Park": THE LACKLOVES!

No embalo do renascimento do power pop, no iníco dos anos 90, surgia mais uma banda com imenso potencial radiofônico. Os Blow Pops despontavam na cena de Milwaukee e prometiam conquistar as paradas de sucesso na medida de seu carisma pop. O próprio nome já trazia para si uma certa responsabilidade, pela ousadia em assumir explicitamente sua capacidade em nocautear pela canção. O talento foi confirmado em seus dois clássicos álbuns, mas o reconhecimento comercial não veio. Em 1995, fim da linha para o quarteto.

Mike Jarvis, um dos líderes do The Blow Pops, seguiu em frente e no ano seguinte deu vida ao The Lackloves. Que já no nome indica um caminho de quem já está mais maduro e irônico. A pegada pop continua intacta, mas a as expectativas se nivelaram no ponto de equilíbrio suficiente para fazer com que a banda já sobreviva por 12 anos. Cathedral Square Park é o quarto álbum do agora trio (Mike Jarvis – vocal/guitarra; Kevin Ponec – baixo; Tommy Dougherty – bateria) e mostra porque os Lackloves refinaram a herança dos Blow Pops e permanecem como uma das bandas mais respeitadas do power pop moderno.

“On My Way” abre o disco apresentando a voz sobreposta de Jarvis, acompanhada por uma batida sessentista e o brilho das Rickenbaker moldando o que chamamos de puro pop. E esse pop perfeito se estende na espetacular “Summer Rain”: melodia auto-adesiva, harmonias vocais celestiais e acordes viciantes. A energética-espacial-psicodélica “Space Age Romeo” te convida a viajar sem sair do lugar. A beachboyniana “Marlena” encanta na melodia fácil e harmonizações aeradas.

“Another Kind Of Girl” é rockinho cinquentista de refrão colante que te leva ao meio do salão até o pop poderoso de “Bended Knees”. “Belong To Sunday” reafirma Mike Jarvis como um grande compositor de melodias pop entremeadas por guitarras brilhantes e batidas nervosas. Se o passado lhe fechou uma porta, com o Lackloves ele abriu várias – uma delas nossa exigente percepção melódica.

http://www.myspace.com/thelackloves
http://www.lackloves.com/

segunda-feira, 16 de junho de 2008

"How Does It Feel": THE WAKING HOURS!

Há cinco anos o Waking Hours escrevia seu nome no hall das grandes bandas do power pop moderno. Não exatamente pelo alcance de massiva audiência. Mas pela consistência de sua parede de guitarras, que fundia-se, harmonicamente, com as finas tramas da melodia pop. E o marco fundamental foi o segundo disco dos americanos da Virgínia – hoje baseados na Califórnia - The Good Way. Que trazia uma das seqüências mais espetaculares da história do estilo: as cinco primeiras canções do álbum (“Sunshine”, “Jade”, “Whispered News”, “Everything’s Alright Forever” e “Use To It”) simplesmente não te dão trégua nem chance de respirar. Pressão sonora impiedosa escoltando refrões contundentes e adesivos.

Tom Richards (vocal e guitarras), Ricky Tubb (guitarras e vocal), Emma Jenson (baixo e vocal) e Sean Sutphin (bateria), voltam meia década depois com este EP de seis canções, como uma espécie de aperitivo enquanto o novo álbum não vem. Aperitivo que no cardápio de muitas bandas teria status de prato principal.

Sem firulas nem rodeios, “New Revolution” mete o pé na porta com a rispidez de um hino punk, desses que precisam de pouco mais de dois minutos para arrasar o quarteirão. Polaridade invertida, a rispidez dá espaço para placidez na faixa título, onde o riff de guitarra cósmico faz flutuar e o vibrafone pontua com toques de quase ternura. “Close To Me” chega com guitarras que às vezes são rudes, às vezes gentis, mas que redundam num space pop atemporal.

A bela “Falling Down (Into Each Other)” capricha nas melodias e harmonias vocais, lembrando que o Waking Hours de The Good Way sobrevive. A baixista Emma Jenson assume os vocais na pesada “Dead” e, a invocada “Get The Fuck Out”, encerra o EP.
A julgar pela disposição dos Waking Hours em How Does It Feel, dá para antever que o próximo disco não vai estar para brincadeiras.

www.wakinghours.com
www.myspace.com/thewakinghours

quarta-feira, 11 de junho de 2008

O pop atemporal e emocional de DAVE STEPHENS!

Algumas vezes, em alguns pontos, não existe diferença entre gerações. Tentar fixar o dial do rádio na canção preferida, talvez tente satisfazer aos mesmos desejos de quem armazena o top 10 pessoal num Ipod. Mesmo que sejam ações separadas por 35 anos de distância. É verdade que o valor intrínseco da música é percebido de maneira diferente pela nova geração – mas é verdade também que o caráter descartável da produção musical contribui para isso. O que continua unindo gerações – do rádio ao Ipod – é a necessidade de captar as variações sensoriais transmitidas pelas músicas e escolher sua característica de acordo com o estado de espírito, seja para revertê-lo ou realçá-lo: energia, reflexão, alegria, tristeza, agressividade, romantismo...

Por isso, sonoridades clássicas e atemporais, como a que Dave Stephens produz, continuam a emocionar. Multiinstrumentista e compositor canadense – hoje baseado em Long Beach, Califórnia – Stephens tem em sua discografia dois álbuns, “Here We Go” de 2004 e “Stories For Copper” de 2006. Dentro, coleções de canções, que quando ouvidas pelos que ‘sintonizavam rádios’, soarão carregadas de saudosismo – eles se lembrarão dos Beatles, Elton John, ELO – e, por aqueles que ‘armazenam em seu Ipod’, soarão como o pop que deveria estar no top 10 – e eles associarão a Ben Folds, Rufus Wainwright, Jason Falkner.

Stephens, em seus discos, conta com a ‘pequena ajuda de alguns amigos’, mas no geral toca tudo sozinho: guitarras, baixo, piano e teclados, faz as partes vocais e ainda arranja as cordas. As composições vão da leveza melódica do Bread até a densidade orquestral do ELO, num inspirado passeio pelo pop guiado por piano. E sem economia na carga emocional impressa – seja na ‘balada quebra-corações’ ou no pop rock mais contundente.

Já em seu álbum de estréia, “Here We Go”, Stephens mostra ao que veio. Na abertura, “I Wish In So Many Ways” explode em um pop orquestral de guitarras incisivas, batidas de piano e órgão flutuando por trás – um mix de Queen, ELO, Beatles – para deixar o jogo ganho antes dos 10 minutos de partida. Se conhecida, seria clássico imortal do pop: “Bittersweet”, uma das baladas mais emotivas dos ’00. Melodia de sonho, para todo mundo chorar junto na beleza do refrão. Sem tempo para fôlego – ou enxugar lágrimas – “Deepest Apologies” - golpeia nas notas de piano, e o seu coração, ao melhor estilo ‘Elton John em boa forma’ (Ben Folds?). O soft rock setentista fala alto e empolga em “Nobody Loves You”. Depois, mais duas belíssimas e tristes baladas voz-piano: “She Smiles” e “Solitude”. O clima interiorano bate ao som do violino e os ritmos mesclados do folk e country pop em “I Love The Way”. O que mostra que Dave Stephens não pode ser encapsulado em só um estilo e que, um álbum seu, é uma torrente de sensações diversas.

“Stories For Copper” veio dois anos depois, seguindo a mesma trilha e confirmando a maestria pop de Stephens. Abre o disco um pequeno clássico na linha Jellyfish: “I’ve Woken Up”, teclado guiando guitarras flamejantes, num balanço contagiante. “The Man That I Once Knew” chega mansa no piano, vai crescendo até desaguar em um dos refrões mais perfeitos dos últimos tempos. Stephens tem uma voz amigável e suave, típica das bandas de soft rock dos anos 70, e domina com destreza tramas melódicas e harmonizações vocais. Tudo bem aplicado na bela “Home” e no pop orquestral de refrão fácil “Just Enough”. Ou na balada grandiosa e canção-título “Stories For Copper”. O rockão arrasa-quarteirão “Memories To Me” esquenta o caldo, mas não derrama. “Full Circle” e “One Little Thing” são macias e agradáveis como veludo; carícias aos ouvidos. A polarização invertida bate e chacoalha a energética e empolgante “Let Me Be”, e, “Alive”, eleva no refrão onírico de harmonias vocais angelicais.

Dave Stephens nos deixa a impressão de não estar procurando por estilos definidos ou público-alvo específico. Sabe do poder emocional e atemporal de suas canções e o potencial de alcance que podem ter. Parece evitar que respostas artificiais – como contratos comerciais - à sua naturalidade autoral, comprometam sua sensibilidade. Permanece gravando em casa e lançando discos por ele mesmo. O que, na realidade atual, é a melhor maneira de se manter fiel às suas convicções e à sua obra. Sem perder as possibilidades de atingir gerações, seja a do rádio, seja a do Ipod.

www.davestephens.ca
www.myspace.com/davestephensmusic

domingo, 8 de junho de 2008

"Pressed": KNIT DELICATE!

A despeito do domínio milenar da perversidade humana sobre a Terra, parte do planeta consegue mover-se pela paixão. A paixão desinteressada, que apenas busca um pouco de alívio para as dores mundanas. Não há dia, não há hora ou minuto em que algum canto do mundo não seja produzido mais um lote de canções movidas pela paixão. Aquelas que, já sabemos, não rendem dinheiro – pelo contrário, custam - não atingem as paradas, mas, abençoadas, nos fazem felizes.

Assim funciona o Knit Delicate, projeto de Charles Jordan, cantor-compositor americano de Milwaukee. Jordan, que participou de diversas bandas locais, vinha durante mais de dez anos compondo e colecionando canções. Depois teve que juntar algum dinheiro e, finalmente, dar luz ao seu primeiro álbum, Pressed, lançado por ele mesmo. Jordan canta e toca as guitarras e conta com a ajuda de amigos para os outros instrumentos. Imagine que, dentro deste panorama, o quanto de pretensão e o quanto de paixão pode haver no álbum.

Desequilíbrio que fica claro logo na abertura do disco, na gana de Charles nos vocais. As guitarras não aceitam brincadeira e a veia pop do compositor salta sem esforço em “Redline”. O sol brilha para todos – assim como o timbre das guitarras – na dourada de melodia ganchuda “Bright Summer Sun”. Vocal dobrado em dois tons diferentes e refrão quebrado em climas opostos e de beleza semelhante em “Strange”. O alt.country à la Wilco antigo aparece imponente em “Abilene” e “Don’t Ever Loose You”.

Contágio certo e duradouro no pop poderoso de refrão auto-adesivo “The Closest”. Já a pedal steel guitar de “Five Shades” nos lembra que as raízes da música tradicional americana permanecem bem supridas. “Merry Go Round” fecha o disco provando que influências de décadas passadas podem exalar frescor se modernizadas. E que o mundo, por hora, pode dar mais uma volta no impulso de uma paixão.

www.myspace.com/knitdelicate

quinta-feira, 5 de junho de 2008

"How Will I Know If I'm Awake": BRENT CASH!

O que te faz sorrir? Para quem vão tuas preces? Qual o seu conceito de divino? E que tipos de sensações podem alterar o estado da sua mente? Muitas podem ser as respostas, mas aqui, tudo pode convergir... Certos sons têm o poder de nos elevar a experiências sensoriais indescritíveis – e contraditórias. Porque, ao mesmo tempo que você se sente entorpecido como num sonho, percebe que... está vivo! Assim, faz muito sentido um disco cujo título se pergunta – absolutamente lúcido sob uma cortina de fumaça onírica: “como saberei se estou acordado?” - já que seu conteúdo sonoro te leva a uma luminosidade cristalina, uma paz absoluta que derruba o ritmo metabólico e aguça a nitidez das percepções.

How Will I Know If I’m Awake é o debute do americano de Athens Brent Cash. Compositor e multiinstrumentista, Cash convocou mais de 20 pessoas, uma verdadeira orquestra, para criar com perfeição e maestria os climas emocionais da obra. Do sunshine pop à bossa nova, de Beatles a Burt Bacharach, todos os elementos para alcançar o bem-estar musical estão aqui. Todas as sensibilidades podem ser estimuladas.

Uma pequena-imensa pérola pop, que inicia o disco dizendo “ei, isto é o paraíso.../ agora as portas foram abertas”, não pode ser por acaso. Melodia de sonho, com arranjos orquestrais impecáveis adornados pela voz angelical de Cash em “Everything That’s Grey”. Agora o céu realmente parece ao alcance das mãos... O sol irradia luz mil vezes mais potente no sunshine pop “Digging The Fault Line” – pianos pontuando em profusão, órgãos voando e harmonias vocais onipresentes. “I Think I’m Falling In Love” viaja em harpas e vibrafones entorpecentes até a energética e macia “Only Time” mesclar a batida bossa nova com metais invocados e uma levada pop contagiante – sem esquecer as harmonizações de voz cheias de ‘pa-pa-pas’.

Brent Cash não esconde que as origens da sua inspiração vêm de sonoridades criadas há mais de três décadas, e impressiona na coesão e harmonia que consegue amarrar em um disco de estréia. Orgulha ver um contemporâneo capaz de nos entregar essas melodias atemporais com tanta beleza e proficiência. Seja em “And Had We Ever...”, “When The World Stops Turning” ou “Love Is Burning Down Tonight”. Texturas e instrumentos se harmonizam na batida ensolarada e convidativa de “Good Morning Sunshine”, enquanto a paixão de Cash pela bossa nova transparece e soa como clara homenagem e referência em “This Sea, These Waves” (onde ele corajosamente arrisca alguns versos em um português ininteligível). Fecha o álbum a bela balada baseada no piano e na emotividade da voz aveludada de Brent “More Than Everything”.

Mas, e afinal de contas, estávamos acordados ou não?

www.brentcash.net
www.myspace.com/brentcashmusic

domingo, 1 de junho de 2008

"Day Into Night": NELSON BRAGG!

A figura do baterista – escondido em meio a pratos e tambores – sempre nos sugeriu uma idéia de ‘coadjuvância’ no contexto de uma banda. O sujeito aplicado que obedece às ordens do chefe, o líder do grupo. E, na hora da composição, recolhido a opinar apenas nas partes percussivas das canções. O ofício principal do americano Nelson Bragg continua a ser o domínio das baquetas, mas, seu talento musical não o prende apenas à boa execução do seu instrumento. Bragg é cantor, compositor e arranjador e chega ao seu primeiro álbum com este Day Into Night.

Mais conhecido por integrar o super grupo de Brian Wilson (inclusive participou da gravação do ansiosamente aguardado Smile), Nelson tocou – e toca – em diversas outras bandas, como Cloud Eleven e Chewy Marble. Agora, como protagonista, mostra uma capacidade absoluta em dominar o artesanato pop – provavelmente conseguida em parte pelo processamento e absorção da obra das bandas com quem tocou. Day Into Night não esconde as influências da Califórnia sessentista, passando obviamente por Beach Boys, Byrds e Crosby, Stills, Nash & Young.

O álbum vem separado em ‘Day’ (“lado A”) e ‘Night’ (“lado B”), em referência à divisão entre canções ensolaradas e reflexivas. Assim, “Forever Days” abre a janela pra deixar o sol entrar na voz doce e macia de Bragg, um órgão sutil, guitarra acústica brilhante e Rick Gallego do Cloud Eleven pontuando na pedal steel guitar. “Tell Me I’m Wrong” traz pegada dos violões típicos da costa oeste americana e carisma pop no refrão. A harmonia vocal perfeita e a melodia empolgante poderiam levar “I Dare You (Show Me Love)” para qualquer parada de clássicas canções.

Assim como a belíssima e sensível balada acústica “Return The Love You Take”. “Dark Sweet Lady” de George Harrison, é revisitada com competência no clima havaiano do ukelele. Para abrir o “lado B”, a beleza harmônica e melódica aprendidas com o mestre Brian Wilson em “Death Of Caroline”. A reflexão acústica de “Don’t Be Afraid Of The Dark” serve aos órfãos de Elliott Smith e contrasta com o clima up de pop perfeito iluminado – apesar de estar no ‘lado escuro’ do álbum – de “Tell Someone”. Um triste e bonito pedido de desculpas transforma “A Father’s Foolish Will” em redenção sonora. Arranjos orquestrais, com batida de piano, dão o tom na grandiosidade pop no encerramento do álbum em “Turn The Darkness Into Gold”.

No fim, Day Into Night nos deixa a certeza que, mesmo a demanda do mercado preferindo manter Nelson Bragg como um requisitado baterista, não seria nada mal se pudéssemos ganhar um novo e talentoso cantor-compositor em tempo integral.

www.myspace.com/nelsonbragg